Meus cursos sobre Gestão do Tempo, o livro Tempo e Razão e o próprio Método PowerSelf despertam paixões, mas também são criticados por não serem fáceis e conter muita filosofia. Fico lisonjeado. Uma estratégia comum nos livros sobre o tema é a de se contrapor a algum aspecto do método do guru da vez com uma proposta simples de quick fix, na expectativa de tomar o seu lugar na lista de best-sellers. Critico isso, mas vou aqui apontar uma falha comum dos apps de gestão de tarefas que não fazem a análise “filosófica” do conceito de prazo que exporei a seguir.
Primeiro há que distinguir duas formas de colaboração. De um lado temos tarefas em que as pessoas colaboram assincronamente, desenvolvendo ações individuais. Paralelamente, temos compromissos em que as pessoas precisam estar simultaneamente conectadas em reuniões ou eventos – até pouco tempo atrás isso significava estar em um mesmo lugar. Compromissos têm local, hora e duração previamente definidas para a sua ocorrência. Tarefas dependem de iniciativa individual para serem iniciadas e podem ser interrompidas e retomadas, desde que respeitem o prazo. E o prazo define sua forma de agendamento. Mas o que é prazo? Parece óbvio o seu significado, mas vou mostrar que o termo embute significados distintos e os problemas práticos que decorrem destas confusões.
Uma primeira confusão é que prazo refere tanto um período como um ponto no tempo. Refere tanto uma extensão de tempo até um determinado momento marcado (hora, dia, mês ou ano) como refere esse próprio momento. O problema aqui é esquecer o “até” e deixar ou marcar a execução para ser feita “no” prazo. O efeito óbvio é sempre trabalhar na urgência e aumentar a ansiedade.
A segunda confusão é mais sutil e requer uma digressão mais profunda, que os desenvolvedores de apps e os autores de best sellers não fazem. Prazo, obviamente, refere um limite de tempo para a tarefa. Mas para que? O que ocorre no fim do prazo? A resposta é simples: o prazo marca uma perda, que ativa o sentimento de urgência.
Nossa natureza animal está programada para evitar perdas, e reagimos ao urgente antes de agir sobre o importante. O sentimento de urgência, que nada mais é do que pressa, mobiliza mais do que a consciência, que precisa ser exercitada pela reflexão para se desenvolver. Então, a tendência natural é deixar para depois tudo que não tem prazo e reagir para evitar perdas ao invés de agir para antecipar ganhos. O sentimento de urgência geralmente ocorre diante de uma ameaça de perda, mas pode estar desvinculado dela, para o bem ou para o mal. Para o bem, convém ter pressa para realizar o que tem mais valor, independentemente da iminência de perda. Para o mal, a pressa pode ser deflagrada por pura pressão psicológica. Se você prioriza a pressão e a pressa terá mais ansiedade. Se prioriza o valor terá mais valor. Simples assim.
Mas voltemos à questão: o que exatamente ocorre no prazo para marcar uma perda? Será apenas a perda da calma – a pressa – uma mudança inteiramente subjetiva? Ou há algum evento objetivo que caracterize a perda? Algumas tarefas têm um evento fatal (uma viagem, uma decisão, uma reunião, etc) cuja ocorrência marca a perda definitiva do valor do trabalho. A mala precisa ser feita antes da partida. O advogado precisa apresentar o recurso antes da sentença. A proposta comercial precisa ser entregue até o momento em que a concorrência é decidida. A ocorrência deste evento é o Prazo Fatal – deadline em inglês. Então, há urgência objetiva se há um evento fatal e ele está próximo – perda iminente. Nesse sentido, ninguém pode dizer: “isso não é urgente para mim” – não é uma questão de valor subjetivo, mas de prazo objetivo. Alguém terá uma perda, isso é um fato, e a iminência deste fato define a urgência objetiva. Resta ainda a avaliação subjetiva da iminência. Os mais ansiosos sentirão a urgência com mais antecedência do que os mais calmos, e há aqueles que só se mobilizam em cima da hora. Para tornar essa avaliação totalmente objetiva, desenvolvi o conceito de “horizonte de planejamento” no livro Tempo e Razão.
E quando não há prazo fatal à vista ou este é distante? Como mobilizar o outro ou motivar a si mesmo? Vamos depender só da consciência e da força de vontade, que costumam falhar? Para isso serve o Prazo Devido – due date em inglês. No Prazo Devido a ação não perde o seu valor, mas o promitente perde crédito. A fixação deste prazo é um expediente de pressão psicológica, que aciona o sentido de urgência. Ninguém quer perder nada, nem crédito. Deixar de distinguir entre os prazos Fatal e Devido pode gerar perdas desnecessárias. As pessoas deixam de fazer algo porque “perderam o prazo”. Mas o prazo perdido, muitas vezes, não era fatal e sim comprometido, e uma tarefa pode ser entregue depois do Prazo Devido mesmo com alguma perda de crédito. Crédito se recupera, perdas definitivas não.
Então, convém definir um Prazo Devido quer você esteja se comprometendo, quer esteja solicitando uma tarefa – ou mesmo quando você está se comprometendo consigo mesmo. O agendamento de uma tarefa é uma definição de folgas. Quando existe Prazo Fatal, a folga se divide em duas. Uma é a Folga Final (ou Folga do Solicitante) entre o Prazo Devido e o Prazo Fatal. Esta é uma folga para que o solicitante fique tranquilo e é negociada com ele. Mas há um terceiro prazo ou Data de Ataque, que é a data do lembrete para executar a tarefa. Note-se que a Data de Início, que é quando efetivamente começa a execução, pode ser depois da Data de Ataque, pois o lembrete pode ser adiado. A folga entre a Data de Ataque e o Prazo Devido é uma Folga Inicial (ou Folga do Executante), que deve considerar mais do que a duração da tarefa, principalmente o fato de que se poderá ter outras tarefas mais prioritárias naquele período. Caso não exista evento fatal, não há folga final e pode-se negociar um Prazo Devido que garanta uma boa Folga Inicial.
Para marcar a Data de Ataque os apps usam o artifício da notificação (lembrete no Outlook) que pode ser sonora e/ou pipocar numa janela no horário programado – nos apps multiplataforma a notificação também aparece como um push no celular. Pior ainda são os apps que usam (mais um ☹) e-mail como forma de notificação. Devemos lembrar que a notificação também é usada para alertar sobre compromissos. Um erro aqui é usar sempre o período padrão do app já que ele deveria ser suficiente para parar o que se estará fazendo, e para cobrir eventual deslocamento e set-up, o que pode variar.
A mistura de lembretes de compromissos e de ações ao longo do dia impede a visão de conjunto necessária para uma priorização racional. Então, convém marcar as notificações de tarefas todas para um mesmo horário no fim do dia anterior ou no início do dia, quando se fará o planejamento do dia, que consiste em confirmar ou remarcar os compromissos do dia e remarcar e priorizar as ações considerando o tempo livre entre os compromissos confirmados.
Outro problema mais grave é que as tarefas na maioria dos apps só têm um único Prazo e são visualizadas naquela data e não na data do lembrete. Este prazo deve ser programado para o Prazo Devido e não para o Prazo Fatal, para evitar crises e perdas, mas isso não fica claro para a maioria dos usuários, que não querem perder a informação do Prazo Fatal. Uma confusão adicional é específica do Outlook, onde pode-se atribuir às tarefas e Itens Sinalizados Datas de Início e de Conclusão. E pode-se escolher visualizar as tarefas numa ou noutra data. E aí vem a dúvida: Data de Conclusão é o Prazo Devido ou Fatal ou marca a data de entrega da tarefa? E Data de Início é Data de Ataque ou é a data de início efetivo da tarefa? Mas a Data de Ataque não é a da Notificação? Nos meus cursos sobre Outlook sugiro uma forma de desfazer a confusão.
Outro mau uso da notificação como Prazo de Ataque de tarefas é adiá-las automaticamente pelo período default da ferramenta. Isso é natural e justificável, já que sempre se está fazendo alguma coisa e o lembrete tem a folga mencionada. Não só esse mau hábito do adiamento automático pode consumir toda a folga, como pode causar um problema mais grave ao se estender aos lembretes de compromissos, causando atrasos e até esquecimento de reuniões e eventos.
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Excelente artigo. Meu amigo e mestre da Gestão do Tempo.
Muito bom!
Continuo planejando meu dia, semana e mês na agenda mesmo. Pena que não dá pra fazer backup dela, tá valendo mais que meu relógio rsrsrs.
Grande abraço Mestre e parabéns pelo artigo.
Adorei o artigo, meu eterno professor Jaime. Parabéns e um grande abraço!
Muito bom. No outlook, criei o campo “Próxima ação” para sinalizar ao longo do período de realização a próxima data em que o tema deve merecer atenção. Organizo minha semana e dias de acordo com este campo. Os demais servem de referência ou para ajustar a “próxima ação” ou o tempo dedicado à questão na agenda.
Um abração.