Vivemos em duas esferas: a privada e a pública. Estamos na esfera privada quando cuidamos das nossas coisas e assuntos individuais. Passamos à esfera pública sempre que atendemos os interesses dos demais. Ação política é justamente a ação na esfera pública.
Os três grandes veículos da ação pública são o Estado (executivo, legislativo e judiciário), o mercado (empresas) e a sociedade organizada (igrejas, sindicatos, associações, ONGs, condomínios). Estas instituições canalizam e orientam, estimulando e limitando, a ação pública de todos os indivíduos.
A ação privada, por seus efeitos, é muito mais egoísta do que a ação pública. A grande maioria da população vive na esfera privada e só age na esfera pública motivada pelo interesse próprio, trabalhando em troca de dinheiro ou subsistência. Paradoxalmente, costuma condenar o interesse próprio dos indivíduos que têm um papel mais atuante na esfera pública: políticos, empresários e dirigentes de organizações sociais. Se computarmos o investimento de tempo e o benefício público das ações dos que criticam e dos que são criticados a injustiça da crítica se evidencia.
Quem age na esfera pública se expõe à crítica. Do síndico ao presidente da república. A crítica motivada pela inveja é um ônus inútil puramente destrutivo. Já o protesto motivado pelo interesse próprio dos que criticam é construtivo, pois o consenso possível entre interesses conflitantes faz a boa política. Ambas as críticas são formas de participação política, mas a defesa do interesse próprio é ativa, enquanto a crítica destrutiva tende a ser mais passiva.
Há três motivações para a ação política: o interesse próprio, a vaidade e o espírito público.
Das três motivações mencionadas, o interesse próprio é o mais mal visto. Entretanto, além de ser o mais frequente é o mais legítimo. No limite, o interesse próprio é puramente individual – egoísmo puro. Mas a ação pública visando o benefício próprio não implica necessariamente prejuízo para os demais. Aliás, quem presta um serviço motivado apenas pelo salário faz exatamente isso. Também pode ser condenável a ação em benefício da família ou do grupo – o corporativismo. Entretanto, a representação de interesses de classe ou grupo é exatamente a base do sistema legislativo. Inclusive, o objetivo de muitas entidades da sociedade organizada é exatamente exercer influência e participar da ação legislativa.
A vaidade é tão mal falada quanto frequente. Realmente, a função pública vem acompanhada da notoriedade, corolário da exposição. Em comparação com quem busca a fama pela fama, apenas pela exposição de sua intimidade em “reality shows”, o reconhecimento que o serviço público recebe é uma honra digna. Que isso envaideça é compreensível. Que o reconhecimento se torne um fim em si mesmo pode ser condenável como um vício vão, mas que pode, paradoxalmente, ensejar ações nobres com grande benefício público.
O espírito público, a noção transcendente do valor de servir é saudada como uma das mais nobres virtudes morais. Esta transcendência é característica do idealista, que coloca um ideal acima do interesse próprio e imediato. Porém, mesmo distante do interesse próprio, o idealista prescreve aos demais a virtude que pratica. E, muitas vezes, no exercício do poder público, além de prescrever, impõe.
Concluindo, todos temos alguma ação na esfera pública, que, numa ótica utilitarista, é a origem do valor pessoal. As virtudes privadas constituem outra fonte de valor, que, entretanto, não geram benefícios públicos. Falar mal da política e dos políticos em nome da virtude moral é uma ação política. E a mais fraca, senão a mais desprezível de todas.