O que temos em comum com a abóbora? Somos seres vivos. A abóbora nasce, cresce, amadure, apodrece e morre. Nós também. A sabedoria da abóbora é nada desejar, nada esperar, nada lamentar. Desapego, budismo, niilismo. Afundada sempre no presente, eterno enquanto dura. Aboboremo-nos pois: vivamos no presente, aqui e agora, afundados na rotina da sucessão dos dias enquanto tivermos fôlego. Afinal, do ponto de vista da eternidade, nada importa mesmo.
O que temos em comum com o cachorro? Somos animais, apesar da falta do rabo. Além de viver, movemo-nos e sentimos. Fugimos da dor, buscamos o prazer, e no processo, expressamos e provocamos sentimentos. Embora nos falte o rabo para abanar ou abaixar, podemos latir, rosnar e ganir. Os sentimentos nos movem e dão sentido. Ora prá lá, ora prá cá, ao sabor das paixões, o que importa é agir. Ou reagir? Movemo-nos ou somos tangidos uns pelos outros?
No que somos diferentes? Falamos. Além de expressar sentimentos, produzimos palavras, conceitos que se agregam em discursos, que se comunicam, e que também fazem a nossa cabeça. Sentimentos geram idéias, que produzem sentimentos, que fazem pensar e sentir, e assim vai. Além da genética, somos produtos e veículos da memética, a propagação evolutiva e seletiva dos “memes” de Dawkins.
Gente abóbora, gente cachorra, gente gente. A gente sempre pode se aboborar ou acachorrar.